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1º de Maio – Dia de Luta e os Desafios da Classe Trabalhadora

O dia 1º de Maio é marcado como dia de luta dos trabalhadores tendo sua origem nas greves ocorridas em Maio de 1886, em Chicago, na época reconhecida como o maior centro industrial dos Estados Unidos. 

O protesto já vinha de anos anteriores e reivindicava melhores condições de trabalho, como a redução da jornada para oito horas e maiores salários. Naquela época, os trabalhadores cumpriam turnos de até 17h por dia, recebendo baixíssimos salários e sem qualquer atenção às condições dignas, como, por exemplo, saúde e segurança dos trabalhadores.

Em 1884, numa conferência da Federação Americana do Trabalho (também em Chicago), os trabalhadores deliberaram que a partir de 1º de Maio de 1886, a jornada limite deveria ser de 8 horas.

Porém, “ignorados” pelos empregadores, que não reconheciam o movimento -, em 1886, ocorreu uma greve geral por todo o País. A represália aos trabalhadores grevistas foi violenta, culminado em mortes e prisões.  O governo dos Estados Unidos não reconhece a data. Lá, o feriado do “Dia do Trabalho” é na primeira segunda-feira de setembro. 

No Brasil, o limite de jornada de 8h foi inicialmente sinalizado em um Decreto de Getúlio Vargas, em 1932, e melhor pautado pela Constituição de 1934. Contudo, a previsão legal da jornada de 8h só veio a se consolidar em 1943, com a CLT. 

O histórico de luta que se iniciou em 1917 – com forte organização da classe trabalhadora fabril – , ganhou força nos períodos de 70 e 80 quando os metalúrgicos do ABC chegaram a paralisar 140 mil trabalhadores e encamparam com força a luta pela redemocratização. 

Neste contexto, o 1º de maio é considerado um marco histórico de lutas da classe trabalhadora no Brasil e no mundo, sendo ao longo dos anos um momento de mobilização e reafirmação do movimento. Porém, apesar das conquistas até então obtidas,  ainda não podemos dizer que atingimos um patamar ideal de equilíbrio entre a relação patrão-empregado dentro do contexto da sociedade capitalista em que vivemos.

Se até então a luta sempre foi por melhoria das condições de trabalho, é fato que a classe trabalhadora brasileira tem um desafio e tanto nos tempos atuais, tendo em vista as grandes “reformas” e alterações legislativas havidas nos períodos entre 2016 e 2017. Além das pautas diretamente ligadas ao trabalho como a dita Reforma Trabalhista – Lei 13.467/2017 –  e a Reforma da Previdência (que ainda permanece na tentativa de aprovação pelo Congresso Nacional num momento futuro), há o desmonte do Estado Social e a desvinculação do Estado como responsável pelo provimento dos serviços essenciais que impactam diretamente na vida de todo trabalhador, como é o caso da PEC que aprovou o congelamento dos “gastos” com saúde e educação por 20 (vinte) anos. 

Associado à este cenário, também está em curso uma política de “congelamento” do salário mínimo, vez que entre 2016 e 2018 os valores de reajuste não deram conta sequer de repor a inflação para manter o trabalhador com a mesma qualidade e condição financeira de vida. Nas categorias, as negociações tem sido resistentes a discutir o reajuste salarial, havendo casos em que a proposta chega ser de ZERO por cento.

Neste cenário de alteração das relações e formas de trabalho e de desmonte do Estado Social, é preciso identificar que está em curso o avanço de um novo modelo de Estado que implica em redefinir o padrão da exploração capitalista no Brasil, sem perder de vista que não há a intenção por parte do Estado e de outros setores em resguardar a dignidade e o equilíbrio nas relações de trabalho. Em resumo, devemos enxergar que todas as alterações recentes foram para retiradas de direitos dos trabalhadores e de limites da exploração da força de trabalho, ao passo que se concretiza um afastamento de responsabilidade dos empregadores e do Estado em várias previsões. Nota-se um grande fortalecimento da autonomia da iniciativa privada. 

Para além das alterações na legislação, do ponto de vista de regras gerais e materiais, as negociações entre empregados e empregadores podem ter prevalência sobre a Lei, ainda que prejudiciais à categoria. Em outras palavras, direitos previstos em Lei poderão ser negociados em troca de “vantagens”. A grande questão é que esta previsão, perante uma legislação que sofreu a retirada de direitos, vem a fragilizar mais ainda a categoria e a sua capacidade de avançar nos direitos já existentes, visto que em algumas situações não há mais a garantia do limite da legislação como patamar de negociação inicial.

A título de exemplo, a exclusão da participação dos Sindicatos nas rescisões contratuais é mais uma medida que desampara o trabalhador que vai deixar de ter orientação sobre seus direitos pela entidade Sindical, além de afastar a fiscalização sobre o correto recolhimento dos encargos fiscais. 

Notadamente, o Direito do Trabalho foi praticamente inserido no campo das relações privadas, como se sobre ele não pesasse mais o interesse público de gerir as relações e garantir determinadas proteções, com o intuito de coibir qualquer abuso à parte que é hipossuficiente.

Não se pode deixar de falar do cenário antidemocrático em que foram aprovadas todas essas medidas, sem qualquer diálogo mais aprofundado com a classe trabalhadora e seus sindicatos, com a população em geral e sem uma verificação responsável sobre possíveis violações a tratados internacionais de direitos humanos e até mesmo a Constituição Federal de 1988.  

Divulgou-se a forte ideia de que tais alterações eram necessárias para modernizar as relações de trabalho e resolver o problema econômico do País com geração de empregos, já que este foi o argumento balizador utilizado pela relatoria da Reforma Trabalhista 

Um estudo realizado pelo CESIT  (Unicamp) demonstrou que tal afirmação não se sustenta a medida que o próprio CNJ  já demonstrou em índices que a grande demanda da Justiça do Trabalho é composta em 49,43% de não pagamento de verbas rescisórias, horas extras e reconhecimento de vínculo empregatício, e 52,01% é de pagamento destas verbas rescisórias. Verificou-se, portanto, que o contingente da justiça do trabalho decorre efetivamente do descumprimento sistemático de obrigações essenciais dos contratos de trabalho pelos empregadores. 

Assim, tanto não se sustenta a razão de tamanha alteração, como que o que se nota é um aprofundamento da crise política e econômica no país, estando a classe trabalhadora novamente (e desde sempre) com a tarefa árdua de reconduzir o Estado aos trilhos da ordem democrática por meio de uma forte e ampliadíssima organização de base e de massa, incluídos aí os desempregados e categorias desorganizadas.

O enfrentamento tem que se dar pelos instrumentos de luta para além das instituições, como por exemplo a greve do dia 28.04.2018 contra a Reforma da Previdência. Existem avaliações diversas sobre os motivos pelos quais o projeto permanece fora da pauta do Governo. Além da forte mobilização grevista, fala-se em uma correlação de forças desfavorável para a aprovação da proposta por conta do desgaste com a base de cada membro do congresso. Há também o entendimento de que, o que parece ser o mais plausível, de que a mobilização e a greve contribuíram para colocar em xeque a aprovação de uma medida que seria eleitoralmente negativa, e que por isso optou-se por não aprová-la neste momento. 

O que se pode observar tanto no dia da greve Geral de 28 de abril como em outros momentos de paralisação e atividades de luta por direitos é uma forte repressão do poder policial a todo aquele que se insurja contra as medidas que estão sendo tomadas, sob o pretexto de que se ameaça a ordem e o patrimônio públicos, cenário similar ao que ocorreu em 1886 nos Estados Unidos. Tal prática permanece com  a onda crescente de criminalização dos movimentos sociais, coletivos, sindicados e partidos políticos. O Estado tem usado a força para conter as massas e impor a ordem, ignorando o seu dever e responsabilidade constitucional para os problemas sociais e tomada de decisões sobre o futuro da sociedade. 

Portanto, o que se vê em curso no Brasil l – ás vésperas de mais um primeiro de maio – é a redução da liberdade democrática e ampliação da exploração da classe trabalhadora através de uma avalanche de retirada de direitos, sendo a luta a ser travada neste período para, além de melhores condições de trabalho, buscar o resgate e freio de todo esse retrocesso de mais de 100 anos. 

Considerando que a classe trabalhadora se acha sem perspectiva para os próximos períodos, é delicado localizar o fio condutor para  provocar um levante popular tamanho que seja capaz de pressionar o Poder, o Estado e os setores financistas dessas medidas. Porém, é preciso ter a consciência de que este é único meio de barrar este modelo desumano de Estado e reconduzir a sociedade a um estado de democracia, ainda que com todas as suas insuficiências e fragilidades. 

REFERÊNCIAS:
Brelle, Junior – Dia de Luta e de Luto – Artigo – acesso via site pelo link  – CESIT – Unicamp, Campinas, 2017, acesso digital aqui
Dalle, Isaías. 1917-2017, 100 Anos de Greve Geral, Passado ou Futuro? – São Paulo, Fundação Perseu Abramo, 2017.

 

Louise de Azevedo Teixeira

Advogada da LBS Advogados
E-mail: louise.teixeira@lbs.adv.br

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