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A PEC ensaiada: migalhas ao povo!

Em continuidade ao nosso acompanhamento da Reforma da Previdência, analisamos o Parecer do Relator da PEC na Comissão de Constituição e Justiça do Senador Federal, o Senador Tasso Jeressait (PSDB-CE).

Após negociação política, o senador optou por não modificar a estrutura da proposta votada na Câmara dos Deputados para que o processo legislativo seja concluído o mais rápido possível, propondo apenas a supressão de alguns trechos, por outro lado, mudanças significativas irão tramitar por meio de uma PEC Paralela.

O relator argumentou pela ponderação entre o equilíbrio fiscal e a proteção social aos mais vulneráveis. Ficou evidente que o senador cedeu em alguns pontos considerados “sociais” em troca de algumas medidas austeras que tramitarão por meio da PEC Paralela.

As alterações no próprio texto foram voltadas à melhoria da redação, mantendo o conteúdo e supressão de dois pontos, quais sejam:

  1. BPC: retirou da PEC o critério de renda limitador para recebimento do Benefício de Prestação Continuada, que havia sido fixado em ¼ de salário-mínimo, o que facilita na concessão do benefício.
  2. Aposentadoria especial: retirou a regra do aumento da pontuação, a partir de 2020, para fins de aposentadoria dos trabalhadores em atividade com efetiva exposição a agentes nocivos.

Já a PEC Paralela propõe significativas alterações, veja:

  1. Inclusão dos Estados e Municípios: diferentemente do texto aprovado na Câmara, em que as regras para aposentadoria só valem para trabalhadores do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e para servidores públicos da União, a PEC Paralela possibilita a adesão da Reforma da Previdência pelos Estados, por meio de aprovação de lei ordinária (processo legislativo mais simplificado), que se aplicará automaticamente ao Município. Contudo, caso o Município não queira aderir aos termos da Reforma, poderá desfazer o ato por meio de aprovação de lei, no período de até 1 ano.
  1. Pensão por morte: no texto enviado pela Câmara, a regra do cálculo da pensão é do benefício de 60% do salário de contribuição para o primeiro dependente e mais 10% por dependente, até o limite de 100%, o cálculo permite que o benefício seja inferior a um salário-mínimo. A alteração, proposta na PEC Paralela, mantém a cota inicial de 60% e prevê cota de 20% por dependente menor de 18 anos de idade, resguardando que a pensão não será inferior a um salário-mínimo.

Destacamos o trecho do relatório que se defende a alteração da regra no cálculo das pensões:

Como já apontado, nos orientamos pela proteção da base da pirâmide. E a ideia de pensionistas vivendo com menos que o salário mínimo é uma não estamos dispostos a aceitar.

Assim, dentre as Emendas apresentadas, nos sensibilizam em especial as Emendas n os 13 e 16, do Senador WEVERTON; 51, da Senadora ELIZIANE GAMA; 74 do Senador RANDOLFE RODRIGUES; 89 do Senador JAQUES WAGNER; 120 do Senador PAULO ROCHA; 139 do Senador PAULO PAIM; e 145 do Senador RODRIGO CUNHA. Elas pugnam exatamente pela manutenção do piso do salário mínimo.

Além disso, avaliamos haver espaço fiscal para um tratamento mais confortável quando houver a presença de crianças e adolescentes entre os dependentes. É principalmente para eles que a pensão por morte existe.

Por isso, prevemos na PEC Paralela que:

– nenhuma pensionista terá renda formal menor do que o salário mínimo, aperfeiçoando e dando força de texto constitucional ao que já dispõe a Portaria no 936, de 8 de agosto de 2019. Este ato é resultado das próprias negociações entre governo e os partidos no âmbito da PEC nas últimas semanas;

  1. Tempo de contribuição para os homens: no texto enviado pela Câmara dos Deputados, para os homens que ainda não estão no mercado de trabalho, para se aposentarem, precisariam de no mínimo 20 anos de contribuição, no texto da PEC Paralela o tempo mínimo de contribuição será de 15 anos.
  1. Aposentadoria por invalidez, em caso de acidente de trabalho: no texto enviado pela Câmara dos Deputados, a regra de cálculo é de 60% da média salarial mais 2% por ano de contribuição que exceder 20 anos, a PEC Paralela prevê acréscimo de 10% na média.

As medidas acima amenizam algumas regras e, segundo o relator, buscam trazer maior conforto aos trabalhadores mais vulneráveis, por outro lado, o relatório sugere algumas medidas que aumentam as receitas para Previdência e, as duas últimas em especial, recaem sobre o bolso do servidor público aposentado. Acompanhe:

  1. Retoma a cobrança de contribuição previdenciária para exportadores do agronegócio e entidades filantrópicas. A isenção ao agronegócio havia sido aprovada na calada da noite às vésperas do texto ser enviado para votação no plenário da Câmara.
  1. Cobrança às empresas do Simples Nacional, a fim de que incentivá-las a investirem em prevenção de acidentes de trabalho.
  1. Prevê reabertura do prazo para que servidores públicos possam aderir ao plano de previdência complementar.
  1. Contribuição extraordinária: possibilita a cobrança de alíquota extra para servidores públicos estaduais e municipais, a fim de equalizar o déficit.
  1. Contribuição sobre a totalidade das aposentadorias e pensões, hoje a cobrança é limitada ao teto do Regime Geral de Previdência Social (atualmente, de R$ 5.839,45)

Em síntese, verificamos que o relator cedeu em alguns pontos defendidos pela oposição para garantir uma rápida aprovação da PEC.

No entanto, a espinha dorsal do texto permanece inalterada: o aumento das idades mínimas, a fórmula de cálculo mais dura, a restrição de conversão de tempos especiais em comuns, a unificação dos benefícios de aposentadoria, a desconstitucionalização de algumas matérias estratégicas e a rigidez das regras de transição, por exemplo.

Tudo aparenta ser um balé cuidadosamente ensaiado: a proposta original enviada pelo Poder Executivo desejava mostrar força e “tolerância zero” com o direito do trabalhador; os deputados tiveram os seus 15 minutos de fama com um relatório mais enxuto e avaliado por setores do mercado como ponderado; por final, os senadores, que não poderiam ficar de fora da dança, buscam seu lugar ao sol com migalhas à classe trabalhadora.

Não nos enganemos, a Reforma ainda é um desmonte, pois impõe prejuízos enormes para aqueles que já estão no mercado de trabalho há muito tempo, bem como para aqueles que entrarão. Por outro lado, o relatório, bem como o início da tramitação da PEC Paralela, amplia o campo de debate e luta. Sigamos!

Camilla Louise G. Cândido

Coordenadora Jurídica
E-mail: camilla.candido@lbs.adv.br

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