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Os retrocessos nos direitos trabalhistas adquiridos pelas mulheres brasileiras pós Reforma Trabalhista

O início do século 20 foi marcado pela luta das mulheres ao redor do mundo. As manifestações aconteciam nas fábricas da Alemanha, da Inglaterra, do México, dos Estados Unidos, da Rússia, com muita resistência na busca por direitos fundamentais, como direito ao voto e fixação de garantias trabalhistas mínimas. Tais manifestações tinham caráter socialista, porque lutavam por igualdade de direitos econômicos, sociais e trabalhistas, bem como sufragista e por igualdade de direitos políticos. 

No Brasil, apenas em 1932 o voto foi conquistado pelas mulheres, há menos de um século. O direito de frequentar ensino superior aconteceu em 1879. Conta em banco, mulher só pôde ter em 1915, ainda sob dependência de autorização do marido. Norma penal específica de proteção às principais vítimas de violência doméstica foi conquistada há apenas 12 anos. Tais datas demonstram o quão recente são, na história do Brasil, os avanços pela igualdade de gênero no setor político. 

Contudo, nos anos de 2016-2017, diversos direitos trabalhistas adquiridos pelas mulheres foram suprimidos. Uma modificação lesiva à trabalhadora é a revogação do antigo art. 384 da CLT. A norma previa às mulheres o intervalo de quinze minutos antes da realização de horas extraordinárias, em harmonia com o texto constitucional, ao passo que este estipula a edição de normas específicas e de caráter protetivo aos grupos menos privilegiados. Assim, a supressão da garantia já demonstra a disparidade do texto infralegal recém-aprovado com relação à Constituição Federal no que tange às normas específicas de proteção à mulher trabalhadora. 

A agressão às conquistas da mulher no campo do Trabalho evidencia-se, também, nas alterações do art. 394-A da CLT. O histórico desde artigo é interessante, pois o texto legal que determinou o afastamento absoluto da gestante/lactante do labor exercido em locais insalubres havia sido aprovado apenas um ano ates da reforma trabalhista, através da Lei 13.287/2016, sancionada por Dilma Rousseff. 

Contudo, em Novembro do ano seguinte, já no governo de Michel Temer, o texto do artigo 394-A da CLT foi completamente deturpado, senão vejamos:

a)    Agora é permitido que a mulher gestante trabalhe em ambientes insalubres; veda-se tão apenas o trabalho da mulher em locais com insalubridade em grau máximo;

b)    Para que a grávida se afaste de ambientes de trabalho cuja insalubridade é classificada em grau médio, é necessário recomendação de médico de sua confiança, recomendando o afastamento. Permite-se, assim, que a gestante trabalhe, por exemplo, diretamente exposta à cola de sapateiro e solventes durante a jornada de trabalho.

c)    A lactante só pode se afastar de locais insalubres mediante atestado de médico de sua confiança recomendando o afastamento. Sem atestado médico, permite que a lactante trabalhe em locais de insalubridade em grau máximo. 

Além disso, as mulheres ganham remuneração salarial inferior a de homens, mesmo com a maioria dos trabalhadores com nível superior completo. É imprescindível, portanto, que a mulher, bem como as demais minorias, constitucionalmente protegidas, esteja representada nas três dimensões de Poderes, a fim de evitar retrocessos como o apresentado. Mais que isso, a representatividade é a única via possível para a edição de políticas públicas específicas para que possamos alavancar as reivindicações intrínsecas a cada minoria. 

A representatividade da mulher no contexto político é um problema sistêmico no país, dada a dominância do patriarcado nos cargos de poder decisivo. A acepção de patriarcado tem raízes do pater famílias, sistema hierarquizado no qual, no topo, estão sempre os homens, em ordem de idade decrescente, sendo que mulheres estão sempre estritamente vinculadas às decisões dos homens da família. No contexto político, patriarcado é a concentração dos poderes decisórios por homens, brancos, com mais idade, ricos, em síntese, privilegiados.

Segundo os dados do Censo 2010, do IBGE, o número de mulheres no Brasil corresponde ao percentual de 51,0332%. Já o TSE sinaliza que 52% do eleitorado brasileiro é composto de mulheres. Vemos a desigualdade na representação política ao extrair da análise do Senado, que apenas 12,34% dos ali presentes são mulheres. Evidente entender que para se aproximar de índices de representatividade real, em um caso como este, seria necessário diminuir este descompasso entre números de mulheres na sociedade e número de mulheres ocupando cargos de alta expressão política. 

Foram necessários 120 anos de República para que a primeira mulher alcançasse, democraticamente, o mais alto cargo político do Brasil. Mas bastou processo inquisitorial, em rede nacional, para fulminar mais esta conquista. Portanto, o arquitetado impeachment da única presidenta do Brasil, simbolizou, para as mulheres, a perda de espaço político recém-adquirido para o poder patriarcal. Para entender melhor como o patriarcado retomou os espaços políticos conquistados pelas minorias nos dois últimos anos, basta olhar a imagem dos Ministérios dos dois últimos governos.  

O Golpe de 2016 atinge sobremaneira as mulheres, já que é retrógrado e arcaico, tanto do ponto de vista social, quanto econômico, quanto político. Fez diminuir o espaço de representatividade feminina nos cargos de alto escalão e nos cargos políticos e retirou garantias trabalhistas especiais à trabalhadora. 

Diante de tanto retrocesso, resistir na luta pela ampliação do espaço de representatividade da mulher no próximo processo eleitoral é medida que honra nossas ancestrais e de proteção às nossas “manas”. Livia Cruz, rapper brasileira, reforça o recado para o Dia Internacional da Mulher: “Nossa elegância é atitude e não traje. Ascensão pra eles é um ultraje, é fato, ameaça, o sistema reage (…) o plano é insano e ele visa à liberdade.”. Sigamos mulheres na luta.  

 

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